O Princípio da Legítima Confiança está ligado ao postulado constitucional da segurança jurídica e aos deveres de lealdade processual, que se aplicam a todos os sujeitos processuais, incluive, ao órgão jurisdicional.
Referida norma já foi contextualizada, como sendo a acepção subjetiva da segurança jurídica, assim expondo o mestre português José Joaquim Gomes Canotilho:
O homem necessita de segurança para conduzir, planificar e conformar autónoma e responsavelmente a sua vida. Por isso, desde cedo se consideram os princípios da segurança jurídica e da protecção da confiança como elementos constitutivos do Estado de Direito.
O princípio geral da segurança jurídica em sentido amplo (abrangendo, pois, a ideia de protecção da confiança) pode formular-se do seguinte modo: o indivíduo têm do direito poder confiar em que aos seus actos ou às decisões públicas incidentes sobre os seus direito, posições ou relações jurídicas alicerçados em normas jurídicas vigentes e válidas por esses actos jurídicos deixado pelas autoridades com base nessas normas se ligam os efeitos jurídico previstos e prescritos no ordenamento.
É importante destacar que tal princípio já teve sua normatividade aplicada, em mais de uma oportunidade, pelo próprio Superior Tribunal de Justiça, conforme se pode observar do seguinte trecho:
PROCESSUAL CIVIL. TEMPESTIVIDADE DA APELAÇÃO. SUSPENSÃO DO PROCESSO. HOMOLOGAÇÃO ANTES DE SER PUBLICADA A DECISÃO RECORRIDA. IMPOSSIBILIDADE DA PRÁTICA DE ATO ENQUANTO PARALISADA A MARCHA PROCESSUAL. HIPÓTESE QUE NÃO SE CONFUNDE COM A ALEGADA MODIFICAÇÃO DE PRAZO PEREMPTÓRIO. BOA-FÉ DO JURISDICIONADO. SEGURANÇA JURÍDICA E DEVIDO PROCESSO LEGAL. NEMO POTEST VENIRE CONTRA FACTUM PROPRIUM. 1. O objeto do presente recurso é o juízo negativo de admissibilidade da Apelação proferido pelo Tribunal de Justiça, que admitiu o início da contagem de prazo recursal de decisão publicada enquanto o processo se encontra suspenso, por expressa homologação do juízo de 1° grau. 2. Cuida-se, na origem, de Ação Declaratória ajuizada pela recorrente contra o Município de Porto Alegre, tendo como objetivo a declaração de nulidade de processo administrativo que culminou na aplicação de penalidades pela instalação irregular de duas Estações Rádio Base (ERBs) naquela municipalidade. 3. O Tribunal a quo não conheceu da Apelação da ora recorrente, porquanto concluiu que se trata de recurso intempestivo, sob o fundamento de que a suspensão do processo teria provocado indevida modificação de prazo recursal peremptório. 4. Com base nos fatos delineados no acórdão recorrido, tem-se que: a) após a interposição dos Embargos de Declaração contra a sentença de mérito, as partes convencionaram a suspensão do processo pelo prazo de 90 (noventa) dias; b) o juízo de 1° grau homologou a convenção em 12.9.2007 (fl. 343, e-STJ); c) posteriormente, em 2.10.2007, foi publicada a sentença dos aclaratórios; d) a Apelação foi interposta em 7.1.2008. 5. Antes mesmo de publicada a sentença contra a qual foi interposta a Apelação, o juízo de 1° grau já havia homologado requerimento de suspensão do processo pelo prazo de 90 (noventa) dias, situação em que se encontrava o feito naquele momento, conforme autorizado pelo art. 265, II, § 3°, do CPC. 6. Não se trata, portanto, de indevida alteração de prazo peremptório (art. 182 do CPC). A convenção não teve como objeto o prazo para a interposição da Apelação, tampouco este já se encontrava em curso quando requerida e homologada a suspensão do processo. 7. Nessa situação, o art. 266 do CPC veda a prática de qualquer ato processual, com a ressalva dos urgentes a fim de evitar dano irreparável. A lei processual não permite, desse modo, que seja publicada decisão durante a suspensão do feito, não se podendo cogitar, por conseguinte, do início da contagem do prazo recursal enquanto paralisada a marca do processo. 8. É imperiosa a proteção da boa-fé objetiva das partes da relação jurídico-processual, em atenção aos princípios da segurança jurídica, do devido processo legal e seus corolários - princípios da confiança e da não surpresa - valores muito caros ao nosso ordenamento jurídico. 9. Ao homologar a convenção pela suspensão do processo, o Poder Judiciário criou nos jurisdicionados a legítima expectativa de que o processo só voltaria a tramitar após o termo final do prazo convencionado. Por óbvio, não se pode admitir que, logo em seguida, seja praticado ato processual de ofício - publicação de decisão - e, ademais, considerá-lo como termo inicial do prazo recursal. 10. Está caracterizada a prática de atos contraditórios justamente pelo sujeito da relação processual responsável por conduzir o procedimento com vistas à concretização do princípio do devido processo legal. Assim agindo, o Poder Judiciário feriu a máxima nemo potest venire contra factum proprium, reconhecidamente aplicável no âmbito processual. Precedentes do STJ. 11. Recurso Especial provido. (STJ. Resp. 1306463/RS, Rel. Min. Herman Benjamin. Dje. 11/09/2012)
Os deveres de lealdade devem ser percebidos como normas cogentes e cuja inobservância conduz a prejuízos concretos às partes e contribui, na maior parte das vezes, para uma duração não razoável do processo.
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