Astreintes: Multa pode ultrapassar valor do contrato e deve ser proporcional ao Poder Econômico do Descumpridor


“Ora, se a ré foi recalcitrante em cumprir ordem judicial quando a multa cominatória fixada alcançou montante multimilionário, não será com a fixação de um valor de menos de R$500.000,00 (quinhentos mil reais), que esse instituto irá cumprir sua função coercitiva, intimidando uma empresa com atuação mundial”.

“a análise sobre o excesso ou não da multa não deve ser feita na perspectiva de quem, olhando para fatos já consolidados no tempo – agora que a prestação foi finalmente cumprida – procura razoabilidade quando, na raiz do problema, existe justamente um comportamento desarrazoado de uma das partes” (AgRg no REsp  1.026.11/RS, minha relatoria, DJe de 23/11/2009).

Com base nessas premissas, o Superior Tribunal de Justiça fixou astreintes no valor de R$ 10.000.000,00 (Dez milhões de reais) contra uma empresa multinacional, em razão desta ter há mais de 49 (quarenta e nove) meses descumprido uma decisão judicial, em uma aplicação da teoria da vedação ao contempt of court.

 Confira a notícia veiculada no site do STJ:

 

 

Se o único motivo para o descumprimento de decisão judicial é o descaso do devedor, justifica-se o aumento da multa diária. E dispondo o devedor de grande capacidade econômica, esse valor será naturalmente elevado, para que a coerção seja efetiva. O entendimento é da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que aumentou a multa imposta à Bunge Fertilizantes S/A de cerca de R$ 480 mil para aproximadamente R$ 10 milhões, mais correção.

O processo originou-se de uma ação revisional de contrato de confissão de dívida agrícola na qual se suspendeu a exigibilidade do instrumento contratual e se determinou a não inscrição do autor em cadastros de inadimplentes até o julgamento final. Não obstante, a Bunge ajuizou ação de execução fundada no contrato de confissão de dívida, cuja exigibilidade estava suspensa por ordem judicial, o que ocasionou a inclusão do nome do agricultor em cadastro restritivo de crédito.

Para a ministra Nancy Andrighi, a multa diária por descumprimento de decisão judicial não é “um fim em si mesma, mas funciona como mecanismo de indução – mediante pressão financeira –, a compelir o devedor ao cumprimento da obrigação e da própria ordem judicial”. Por isso, seu valor deve ser apto a influir concretamente no comportamento do devedor, diante de sua condição econômica, capacidade de resistência, vantagens obtidas com o atraso e demais circunstâncias.

Porém, segundo jurisprudência do STJ, a multa não pode resultar em enriquecimento ilícito do credor. No caso, mantida a multa inicialmente fixada, a cada cem dias ela alcançaria o valor do próprio contrato originário da controvérsia. Além disso, a multa não deve possuir o caráter indenizatório que recebeu do juízo da execução. A ministra lembrou que a reparação pelos danos por inscrição no cadastro de inadimplentes poderia ser buscada pelo agricultor em ação própria – o que poderia resultar em dupla “premiação” pelos mesmos danos.

Por outro lado, a redução deve ser rejeitada se o único obstáculo ao cumprimento da decisão for o descaso do devedor. Para a ministra, a análise sobre o excesso ou adequação da multa não deve ser feita na perspectiva de quem olha para os fatos já consolidados no tempo. Assim, não se deve procurar razoabilidade atual quando a raiz do problema existe justamente em um comportamento desarrazoado da parte.

No caso específico, a Bunge, mesmo não cabendo mais recurso, ainda segue descumprindo a determinação de não incluir – ou, a essa altura, retirar – o nome do autor de cadastros de restrição de crédito. Mesmo após ver recusada a execução, o que comprovou ter ponderado mal seu direito, a Bunge não tentou realizar a baixa da inscrição.

Para a ministra, a decisão do Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO) de reduzir a multa de cerca de R$ 300 milhões para R$ 480 mil acabaria por premiar a insubordinação e o comportamento reprovável da Bunge, que – destacou – ainda não cumpriu a ordem judicial. Segundo a relatora, se a empresa não atendeu à determinação quando a multa atingiu valores “multimilionários”, não seria com a fixação de um valor abaixo de R$ 500 mil que a penalidade alcançaria sua função coercitiva, “intimidando uma empresa com atuação mundial do porte da Bunge”.

A ministra também ressaltou que não existe, no STJ, precedente no sentido de reduzir o valor das multas diárias enquanto ainda persiste o descumprimento da ordem judicial.

 Fonte: Superior Tribunal de Justiça (STJ)

 

 

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